O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

11 de agosto de 2010

30 anos de Campanha por um tradicionalismo católico absurdo

Bento XVI e o catolicismo conservador.
30 anos de campanha, segundo revista americana


Alguns acreditam que o Papa Bento XVI é
"o maior estudioso que governa a Igreja desde o papa Inocêncio III",
do século XIII.
Escândalos de abusos de crianças têm marcado o seu mandato.


A reportagem é de Robert Marquand, publicada pela revista The Christian Science Monitor, 06-08-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nos últimos 30 anos, o Vaticano tem se movido fortemente para reafirmar a autoridade de um Catolicismo Romano tradicional e até mesmo ortodoxo – trazendo a noção de uma "única igreja verdadeira" para a Europa e então para o mundo em geral. A intenção foi inverter a tendência "aberta" ou de liberalização da Igreja representada pelo Vaticano II.

Nas últimas três décadas, o Vaticano reprimiu a Teologia da Libertação, afirmou a moral sexual tradicional e agora está apoiando silenciosamente grupos católicos ultradevotos como a Opus Dei e a Legião de Cristo – ao mesmo tempo em que restringe o alcance ecumênico e descreve as Igrejas Protestantes como não autênticas.

O exemplo mais constante, diligente e sério dessas medidas é um tímido mas brilhante teólogo alemão, Josef Ratzinger – hoje Papa Bento XVI.

O estudioso renascentista Anthony Grafton, da Universidade de Princeton, que não católico, diz que o Papa Bento XVI é "provavelmente o maior estudioso que governa a Igreja desde [o papa] Inocêncio III", do século XIII.

"Não há nenhuma grande questão, nenhuma direção na teologia católica, que não foi dominada por Ratzinger ao longo das últimas três décadas", diz Hermann Häring, teólogo liberal, que estudou com Ratzinger e escreveu um livro sobre sua teologia.

No entanto, um grande esforço para restaurar a autoridade e fazer com que a Igreja seja mair pura coincide com uma impureza épica – o abuso de crianças por milhares de padres e muitos bispos nos Estados Unidos, na Europa e em outros lugares. Para entender as respostas passadas, presentes e talvez futuras do Papa Bento XVI à crise dos abusos sexuais, deve-se examinar o arco de sua vida religiosa.

Sua visão de reforma da Igreja Católica foi muitas vezes tão absorvente que a pedofilia foi varrida para debaixo do tapete do Vaticano, dizem algumas fontes. Ao mesmo tempo, a repressão do Concílio Vaticano II – o controverso concílio papal de três anos em meados da década de 60 – ampliou uma cultura do medo, do sigilo e da hierarquia. "Muitas regras e códigos caíram, mas os esforços para 'se pronunciar' foram frustrados", diz uma autoridade jesuíta na Alemanha, com conhecimento do assunto.

"[O Papa] João Paulo II foi o rosto da missão mundial da Igreja, enquanto Ratzinger ficou em Roma, trabalhando sobre livros, estabelecendo regras como o executor do Papa", diz Karl-Josef Kuschel, da Universidade de Tübingen, na Alemanha [e também vice-presidente da Fundação Ética Mundial]. "Ratzinger nomeou bispos durante 30 anos. Agora é a sua Igreja. Os bispos hoje foram escolhidos exatamente porque concordam com ele".

Em dezenas de entrevistas com autoridades da Igreja e teólogos da Alemanha, dos EUA, da Espanha e da França, muitos católicos dizem que o Vaticano não está perdendo oportunidades nem está "desafinado" em seu tratamento da pedofilia. Pelo contrário, os casos de abuso estão se esgotando de forma espasmódica dentro da visão do Papa sobre a Igreja como árbitro último da autoridade espiritual, das Escrituras e da santidade na Terra. Nesse sentido, o Vaticano não está buscando se adaptar, se modernizar ou se abrir a novas interpretações. Declarações recentes do Vaticano contra a ordenação de mulheres e que reafirmam o celibato sacerdotal são pequenos exemplos disso.

"O mundo é mau, e a Igreja é pura", diz uma autoridade da Igreja austríaca. "Isso é grave para Bento XVI. Ele não quer que a Igreja seja uma piada. Ele é suspeito de caos e de evitar a disciplina e a ordem, e de esforços humanos para adotar a cultura popular e criar uma Igreja fora do mundo, em vez de uma Igreja que transforma o mundo. Isso o frustra profundamente. Ele vê toda a salvação ocorrendo dentro da Igreja Católica. Ele acredita nisso".

Entretanto, ironicamente, os abusos de crianças, sem dúvida, trouxeram uma desordem ainda maior do que o fermento do Vaticano II no final dos anos 60. Na metade deste ano, o Papa descreveu a pedofilia como "fofocas mesquinhas da opinião dominante" [na verdade, a frase foi proferida pelo cardeal Angelo Sodano], antes de fazer um giro de 180 graus e pedir perdão na Basílica de São Pedro no dia 11 de junho: "Nós imploramos insistentemente o perdão de Deus e das pessoas envolvidas, prometendo fazer todo o possível para assegurar que tais abusos nunca aconteçam novamente".

De progressista a tradicionalista

Ratzinger nem sempre foi visto como o executor conservador da doutrina católica. Em 1965, a chegada de Ratzinger à faculdade de teologia em Tübingen trouxe uma agitação de antecipação. O best-seller de Ratzinger "Introdução ao Cristianismo" parecia ser um novo impulso para a democracia e a liberdade. A universidade tinha uma faculdade conjunta entre protestantes e católicos. A mudança estava no ar. Ratzinger foi trazido por Hans Küng, uma jovem celebridade progressista suíça do Vaticano II. Por um tempo, parecia que os dois homens estavam no começo de uma bela amizade.

O nazismo e a guerra perturbaram os jovens católicos alemães, que eram suspeitos de uma ideologia absoluta. O Vaticano II pareceu "abrir" a Igreja e permitir o diálogo e a divulgação de opiniões, sem medo da represália eclesiástica. Em Tübingen, os protestantes participavam do aprendizado católico. Os católicos aprendiam conceitos protestantes de interpretação das escrituras e ideias subjetivas sobre espiritualidade a partir dos ensinamentos do teólogo suíço Karl Barth e do teólogo alemão Rudolf Bultmann.

Porém, a primeira palestra de Ratzinger para a faculdade conjunta, uma tradição importante para os novos professores, foi surpreendente. Ele falou sobre "O significado dos Padres da Igreja para o cristianismo". Küng ficou "um pouco chocado", diz o professor Häring. "Ratzinger disse que a base da verdadeira teologia não era a Bíblia, mas a Bíblia conforme interpretada por cinco séculos de Padres da Igreja. Basicamente, ele estava dizendo à faculdade protestante: 'Percam-se'. Ele estava dizendo: 'Vocês devem retornar à teologia grega... ao helenismo".

As passeatas de protesto estudantis em Tübingen nos anos 60 foram um divisor de águas para Ratzinger, levando-o para o conservadorismo. Ele foi embora para um tranquilo colégio bávaro. Ele escreveu contra a democracia na Igreja, repreendeu severamente a influência do marxismo e criticou o que ele chamou de "ditadura do relativismo". Ele não gostava das expressões individualismo, crise da fé, busca de liberdade e de sentido, dos momentos existenciais. "Ele via isso como indivíduos separados da instituição coletiva da Igreja, na qual a salvação e o sentido são encontrados. Ao serviço da Igreja verdadeira, descobre-se uma nova vida", diz o professor Kuschel.

Em 1977, Ratzinger tornou-se arcebispo de Munique e de Freising. O ex-jesuíta Paul Imhoff se lembra de Ratzinger como alguém absorvido pelo catolicismo medieval. Imhoff, que foi ordenado por Ratzinger antes de deixar a Igreja para se casar com uma estudante de teologia, foi para um "carnaval de professores" com ele. "Tivemos piadas, dança, diversão inofensiva... Ratzinger era encantador. Mas todo o tempo ele falou sobre a restauração da velha Europa... em que a Igreja tem precedência sobre o Estado".

Pedofilia: não em seu radar

Os casos de pedofilia começaram a aumentar nos arquivos do Vaticano nos anos 80. Mas então, como chefe da disciplina da Igreja, Ratzinger focou-se principalmente em silenciar os padres ou os teólogos da libertação, como o brasileiro Leonardo Boff, que tentou capacitar os agricultores e os campesinos. A década de 90 trouxe críticas severas contra o aborto, os direitos dos homossexuais, o casamento gay, contracepção e a promoção da abstinência e do celibato – enquanto os bispos dos EUA denunciavam centenas de casos de abusos de crianças, mas recebendo pouca clareza sobre como lidar com eles.

A maioria dos prefeitos da Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) da Igreja atuam por dois mandatos, ou 10 anos. Ratzinger atuou por 24 anos e em seguida tornou-se Papa.

Nos últimos anos, um foco do Vaticano sobre o alcance ecumênico abriu caminho para o alcance evangelizador. Em junho, um novo escritório pontifício para "evangelizar" as áreas do mundo que sofrem de "um eclipse do sentido de Deus" foi anunciado. A Igreja tem rejeitado os protestantes e tem marcado linhas duras contra o Islã. Mas Roma reforçou os laços com as Igrejas Ortodoxas Orientais.

No dia 21 de julho, o patriarca ortodoxo russo Kirill elogiou o Papa por se manter firme contra a ordenação sacerdotal de mulheres e por não sucumbir a "elementos pecaminosos do mundo" que se infiltraram nas Igrejas protestantes por meio do clero gay e feminino, e se ofereceu para trabalhar com o Papa em questões mundiais.

Hoje, após a sua jornada de 30 anos para reformar a Igreja, os escândalos sexuais podem ser uma herança considerável. Ainda não está claro para onde o Papa se dirige. No mês passado, houve algumas mudanças no tom e na atenção. No final de julho, a Igreja estendeu para 20 anos o período em que as reivindicações das vítimas podem ser investigadas. Mas a questão fundamental – se os padres abusadores devem ser denunciados às autoridades civis – ainda não foi decidida em Roma.

Além de seus poucos pronunciamentos, as opiniões do Papa acerca dos escândalos sexuais é um enigma. Fontes do Vaticano dizem que o pontífice passa seu tempo escrevendo livros e só vê duas autoridades da Igreja regularmente. "Até os bispos agora têm que esperar duas semanas ou mais para uma reunião", diz uma autoridade da Igreja que está preocupada com isolamento do Papa.

Fonte: http://lc4.in/3M7P

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