O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

17 de janeiro de 2011

Adeus Pe. Marcus Bach !



Pe. Marcus vivia no Rio Grande do Sul, era dessas pessoas únicas que conseguiram encarnar o espírito
do Concilio Vaticano II.

Era um dos grandes defensors de um cristianismo autêntico semelhante ao praticado pelas primeiras comunidades.
Uma grande perda para todos nós.

Reproduzo aqui duas matérias uma do blog Unificante
http://unificante.blogspot.com e outra de 2008 que foi pulicada no blog da IHU
J Ricardo


Blog Unificante

Adeus Pe. Marcos!

Aqui em São Paulo, recebi hoje telefonema da Célia Bach, comunicando que às duas horas desta madrugada faleceu o querido Pe. João Marcos Bach,SJ, no Residencial São José, em São Leopoldo, onde estava internado nos últimos meses. Algumas vezes no ano passado eu o visitei na sua enfermidade e muitas vezes o visitei em Portão e Bom Princípio. Na década de 90 ele residiu quase 6 anos no Vale de Nazaré. A Fraternidade o tirou de um certo ostracismo eclesial naqueles anos e Pe. Marcos ajudou muito nas comunidades da Paróquia Espírito Santo e animou um grupo de leigos por 3 anos numa reflexão mais elevada e mais crítica da fé.

Hoje às 17h a Comunidade dos Padres Jesuítas celebrará a Santa Missa de sufrágio, na capela do Residencial São José, fazendo o sepultamento a seguir junto ao túmulo do Pe. Reus.

À Célia nossa fraterna solidariedade pelos longos anos em que ela se tornou irmã e companhia zelosa junto à pessoa de Pe. Marcos. De uma forma prática e vivencial a Célia nos deu este bonito testemunho. Obrigado Célia!

Pe. Marcos foi um divisor de água entre a mediocridade eclesial e a profecia.

Muitos o detestavam e muitos outros o amavam. Seus inúmeros livros enfoca uma série de temas e sempre semeiam idéias para o futuro, questionando a acomodação e visão curta da realidade e da história.

Pensamentos assim, fustigantes, faz muita falta nesses tempos de endeusamento institucional e redução da profecia.

Dom Ivo Lorscheiter tinha grande apreço pela pessoa de Pe. Marcos. Há 10 anos eu acompanhei Dom Ivo, levando ele à casa de Pe. Marcos, onde os dois passaram um dia inteiro com muita prosa e amizade.

QUE ELE DESCANSE NA PAZ DO DEUS VIVO
A QUEM SERVIU COM FIDELIDADE,
MESMO QUE NEM SEMPRE
DENTRO DA ECLESIAL INSTITUCIONALIDADE!




Esta foto foi feita no dia 14.01.2009, quando de uma visita em Portão.

Pe. Marcos tinha então 93 anos.



Matéria do IHU

Marcus Bach.
Um gênio incompreendido pelo seu tempo



No dia 26 de fevereiro de 2008, o blog do IHU, publicou o seguinte depoimento de Graziela Wolfart, jornalista, sobre Marcus Bach, padre jesuíta, ontem falecido, em São Leopoldo, RS.
Eis o depoimento.
Um pequeno apartamento, de um dormitório, no sossegado município de Bom Princípio, no Rio Grande do Sul, é o cenário onde vive um gênio de 92 anos que insiste em defender idéias além do seu tempo. Sim, ele vive ainda, com saúde. E pensa, lê e escreve. Na cabeceira, dois livros: Despertar de uma Nova Consciência, de Eckhart Tolle, e Microfísica do Poder, de Michel Foucault. Em frente ao sofá da sala, uma estante enorme, repleta de livros. Do total, mais de 40 são de sua autoria, mas apenas 14 foram publicados. Cerca de 30 obras estão lá, intactas, à espera de uma editora que possa tornar público o conhecimento e a sabedoria deste senhor de cabelos ralos e longos e de barba cerrada. Estou falando do padre jesuíta José Marcus Bach.

A jornalista que escreve este artigo teve a oportunidade de conhecer pessoalmente este homem que, por muitos, é considerado um grande mestre, e por outros, uma pessoa contraditória e até confusa. Ele explica. “Faz 30 anos que digo a mesma coisa e apenas agora algumas das minhas idéias começam a fazer sentido. O que eu escrevo hoje só será compreendido pelas gerações que viverem daqui a 50 anos”. E avisa: “vocês não tem dimensão da gravidade da situação que estamos nos aproximando. O pesadelo que aguarda a humanidade não virá das catástrofes climáticas e com a doença do Planeta Terra, mas da falta de amor entre os homens”.

Pe. Marcos descobriu que o amor é o caminho para a salvação da humanidade. O amor incondicional, amor que Deus ensina e que Cristo pregou na Terra. “Quem chega ao final de sua vida e descobre que nunca amou ninguém como a si próprio e não foi amado dessa forma, pode ter certeza de que teve uma vida vazia, jogada fora”. Por essa razão e com o objetivo de dividir seu conhecimento e continuar aprendendo, Pe. Marcus decidiu criar a Comunidade Eclesial de Amor em Cristo (CEAC). Trata-se de um grupo que realiza encontros comunitários e familiares nas cidades de Portão eBom Princípio. O objetivo é oferecer “uma oportunidade de dar, de repartir e compartilhar com outros um excesso de amor que nossa sociedade de consumo não consegue absorver”.

O doutor em Teologia fala muito. Tem necessidade de exteriorizar suas reflexões. E uma delas é sobre a importância de viver o presente. “Esqueçam do passado e não se preocupem com o futuro. Vivam o agora, o presente. Pensar que estamos dentro de uma linha de tempo é bobagem. Aprendemos que nossa vida acontece no tempo e, após a morte, passamos para a eternidade. Mentira! Já estamos na eternidade. O que precisamos é viver de forma mais contemplativa e tranqüila o momento presente. Eu esqueço que tenho 92 anos. A idade é você quem faz”, explica. No entanto, depois de um período de uma cansativa explanação, ele “desliga o cérebro”, conforme suas palavras. Observo seus movimentos. Ele se recosta no sofá, olha para cima, com o olhar parado, fixo, respira lentamente. Está fora do mundo, com certeza. E ele garante que não escuta nada do que se fala a sua volta. “Preciso desses momentos para recuperar energia”. Em instantes, ele volta a falar.

Mas Pe. Marcos não vive sozinho. Desde 1977 ele conta com o amor, o companheirismo e a ajuda de Célia Bach, sua prima, que também é sua parceira intelectual. Com ela, escreveu A caminho da verdade interior. Liberte-se meditando. (Petrópolis: Vozes, 1986). Entre seus livros publicados mais recentemente, cito A esperança cristã: guardar tradições ou abrir horizontes?(São Paulo: Paulus, 1999) e Uma Nova Moral? (Petrópolis: Vozes, 1990). A inspiração de Pe. Marcus Bach vem do também jesuíta Teilhard de Chardin, outro que foi incompreendido por todos de sua época. Por isso, é possível entender porque, entre os livros de Bach não publicados, parados lá na estante, estão obras que falam sobre ciência e Deus, teoria quântica, Deus, caos e ordem, novos laços afetivos na pós-modernidade, entre outros temas que definitivamente, para muitos, ainda não fazem sentido. E o jesuíta garante: “Hoje, os cientistas estão mais perto de Deus do que os teólogos”.

Entre os projetos de Pe. Marcus e Célia, está a consolidação da Associação Cultural Pe. Marcus Bach (APEBACH), que, mesmo ainda sem sede construída, já tem um calendário de atividades culturais para 2008. Célia conta que a prefeitura do município de Portão já doou um terreno para a construção da sede. Enquanto isso, as palestras serão realizadas na biblioteca pública de Portão. O tema central das conversas é “ainda há espaço para o amor humano na pós-modernidade?”.

A jornalista que vos escreve não se conteve em perguntar ao sábio jesuíta sobre o papel de Deus na sociedade contemporânea. Pe. Marcus não hesitou em responder que é fundamental. “Deus é o único capaz de perdoar a todos sem impor condições ou questionamentos. E é o único capaz de amar a todos incondicionalmente”. “E o senhor acha que o ser humano, na sua essência, nasce bom ou mau, Pe. Marcus?”, pergunto eu. “Todos nascemos com uma carga de bondade. A explicação para a maldade humana é a falta de amor. Ou você acha que Deus criaria seres ruins? A filosofia ensina que a maldade é necessária para que possamos reconhecer a bondade. Como saberíamos o que é bom se não conhecêssemos o outro lado?”, dispara, antes de mais um momento de “pausa restauradora”.

No meio da tarde, aparece outra visita, de um ex-aluno de Pe. Marcus. Lá, ele comenta se já sabiam do falecimento de Hugo Assmann. Sim, já sabiam. A Célia lê todos os dias as Notícias do Dia, do site do Instituto Humanitas Unisinos – IHU. “Muito bom, conhecem?”. Levei de presente para eles três edições da revista IHU On-Line, que também conhecem e acompanham. Ficaram muito felizes.

E de pensar que eu fui até lá para acompanhar meu marido que, na infância, brincava no pátio da casa de Marcus e Célia Bach, em Montenegro, e desenhava borboletas entre as roseiras que o próprio jesuíta gostava de plantar. Em nossa conversa, falamos ainda de casamento, de família, de robótica, de cotas raciais e de educação. Foi uma grande aula. Dessas que sempre faltam na faculdade. Dessas que a gente não encontra por aí. Dessas que marcam a gente. Quem conhece José Marcus Bach sabe do que estou falando. Quem não conhece e já ouviu falar, pode imaginar. Mas quem não conhece, basta ir até lá. Naquele pequeno apartamento, de um dormitório, cercado de árvores, em Bom Princípio. Lá tem chimarrão, biscoito, doce de pêra e conhecimento.

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