O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

24 de julho de 2013

Discurso do Papa Francisco - Inauguração Polo de Atendimento para Dependentes Químicos


Senhor Arcebispo do Rio de Janeiro,
Amados Irmãos no Episcopado
Distintas Autoridades,
Queridos membros da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência,
Prezado médicos, enfermeiros e demais profissionais de saúde,
Amados jovens e familiares!
Quis Deus que meus passos, depois do Santuário de Nossa Senhora Aparecida, se dirigissem para um particular santuário do sofrimento humano, que é o Hospital São Francisco de Assis. É bem conhecida a conversão do Santo Patrono de vocês: o jovem Francisco abandona riquezas e comodidades do mundo para fazer-se pobre no meio dos pobres, entende que não são as coisas, o ter, os ídolos do mundo a verdadeira riqueza e que estes não dão a verdadeira alegria, mas sim seguir a Cristo e servir aos demais; mas talvez seja menos conhecido o momento em que tudo isto se tornou concreto na sua vida: foi quando abraçou um leproso. Aquele irmão sofredor foi «mediador de luz (…) para São Francisco de Assis» (Carta enc. Lumen fidei, 57), porque, em cada irmão e irmã em dificuldade, nós abraçamos a carne sofredora de Cristo. Hoje, neste lugar de luta contra a dependência química, quero abraçar a cada um e cada uma de vocês – vocês que são a carne de Cristo – e pedir a Deus que encha de sentido e de esperança segura o caminho de vocês e também o meu.
Abraçar. Precisamos todos de aprender a abraçar quem passa necessidade, como São Francisco. Há tantas situações no Brasil e no mundo que reclamam atenção, cuidado, amor, como a luta contra a dependência química. Frequentemente, porém, nas nossas sociedades, o que prevalece é o egoísmo. São tantos os “mercadores de morte” que seguem a lógica do poder e do dinheiro a todo o custo! A chaga do tráfico de drogas, que favorece a violência e que semeia a dor e a morte, exige da inteira sociedade um ato de coragem. Não é deixando livre o uso das drogas, como se discute em várias partes da América Latina, que se conseguirá reduzir a difusão e a influência da dependência química. É necessário enfrentar os problemas que estão na raiz do uso das drogas, promovendo uma maior justiça, educando os jovens para os valores que constroem a vida comum, acompanhando quem está em dificuldade e dando esperança no futuro. Precisamos todos de olhar o outro com os olhos de amor de Cristo, aprender a abraçar quem passa necessidade, para expressar solidariedade, afeto e amor.
Mas abraçar não é suficiente. Estendamos a mão a quem vive em dificuldade, a quem caiu na escuridão da dependência, talvez sem saber como, e digamos-lhe: Você pode se levantar, pode subir; é exigente, mas é possível se você o quiser. Queridos amigos, queria dizer a cada um de vocês, mas sobretudo a tantas outras pessoas que ainda não tiveram a coragem de empreender o mesmo caminho de vocês: Você é o protagonista da subida; esta é a condição imprescindível! Você encontrará a mão estendida de quem quer lhe ajudar, mas ninguém pode fazer a subida no seu lugar. Mas vocês nunca estão sozinhos! A Igreja e muitas pessoas estão solidárias com vocês. Olhem para frente com confiança; a travessia é longa e cansativa, mas olhem para frente, existe «um futuro certo, que se coloca numa perspectiva diferente relativamente às propostas ilusórias dos ídolos do mundo, mas que dá novo impulso e nova força à vida de todos os dias» (Carta Encícl. Lumen fidei, 57). A vocês todos quero repetir: Não deixem que lhes roubem a esperança! Mas digo também: Não roubemos a esperança, pelo contrário, tornemo-nos todos portadores de esperança!
No Evangelho, lemos a parábola do Bom Samaritano, que fala de um homem atacado por assaltantes e deixado quase morto ao lado da estrada. As pessoas passam, olham, mas não param; indiferentes seguem o seu caminho: não é problema delas! Somente um samaritano, um desconhecido, olha, para, levanta-o, estende-lhe a mão e cuida dele (cf. Lc 10, 29-35). Queridos amigos, penso que aqui, neste Hospital, se concretiza a parábola do Bom Samaritano. Aqui não há indiferença, mas solicitude. Não há desinteresse, mas amor. A Associação São Francisco e a Rede de Tratamento da Dependência Química ensinam a se debruçar sobre quem passa por dificuldades porque veem nestas pessoas a face de Cristo, porque nelas está a carne de Cristo que sofre. Obrigado a todo pessoal do serviço médico e auxiliar aqui empenhado! O serviço de vocês é precioso! Realizem-no sempre com amor; é um serviço feito a Cristo presente nos irmãos: «Todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes» (Mt 25, 40), diz-nos Jesus.
E quero repetir a todos vocês que lutam contra a dependência química, a vocês familiares que têm uma tarefa que nem sempre é fácil: a Igreja não está longe dos esforços que vocês fazem, Ela lhes acompanha com carinho. O Senhor está ao lado de vocês e lhes conduz pela mão. Olhem para Ele nos momentos mais duros e Ele lhes dará consolação e esperança. E confiem também no amor materno de Maria, sua Mãe. Esta manhã, no Santuário da Aparecida, confiei cada um de vocês ao seu coração. Onde tivermos uma cruz para carregar, ao nosso lado sempre está Ela, nossa Mãe. Deixo-lhes em suas mãos, enquanto, afetuosamente, a todos abençôo.
Fonte: Boletim da Sala de Imprensa da Santa Sé


Homilia do Papa Francisco no Brasil - Santa Missa em Aparecida - JMJ Rio2013


Venerados irmãos no episcopado e no sacerdócio,

Queridos irmãos e irmãs!

   Quanta alegria me dá vir à casa da Mãe de cada brasileiro, o Santuário de Nossa Senhora Aparecida. No diaseguinte à minha eleição como Bispo de Roma fui visitar a Basílica de Santa Maria Maior, para confiar a Nossa Senhorao meu ministério de Sucessor de Pedro. Hoje, eu quis vir aqui para suplicar à Maria, nossa Mãe, o bom êxito da JornadaMundial da Juventude e colocar aos seus pés a vida do povo latino-americano.
   Queria dizer-lhes, primeiramente, uma coisa. Neste Santuário, seis anos atrás, quando aqui se realizou a VConferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, pude dar-me conta pessoalmente de um fato belíssimo:ver como os Bispos – que trabalharam sobre o tema do encontro com Cristo, discipulado e missão – eram animados,acompanhados e, em certo sentido, inspirados pelos milhares de peregrinos que vinham diariamente confiar a sua vida aNossa Senhora: aquela Conferência foi um grande momento de vida de Igreja. E, de fato, pode-se dizer que o Documentode Aparecida nasceu justamente deste encontro entre os trabalhos dos Pastores e a fé simples dos romeiros, sob a proteçãomaternal de Maria. A Igreja, quando busca Cristo, bate sempre à casa da Mãe e pede: “Mostrai-nos Jesus”. É de Mariaque se aprende o verdadeiro discipulado. E, por isso, a Igreja sai em missão sempre na esteira de Maria.
   Assim, de cara à Jornada Mundial da Juventude que me trouxe até o Brasil, também eu venho hoje bater à portada casa de Maria, que amou e educou Jesus, para que ajude a todos nós, os Pastores do Povo de Deus, aos pais e aoseducadores, a transmitir aos nossos jovens os valores que farão deles construtores de um País e de um mundo mais justo,solidário e fraterno. Para tal, gostaria de chamar à atenção para três simples posturas: Conservar a esperança; deixar-sesurpreender por Deus; viver na alegria.

1.       Conservar a esperança. A segunda leitura da Missa apresenta uma cena dramática: uma mulher – figura de Mariae da Igreja – sendo perseguida por um Dragão – o diabo - que quer lhe devorar o filho. A cena, porém, não é de morte, masde vida, porque Deus intervém e coloca o filho a salvo (cfr. Ap 12,13a.15-16a). Quantas dificuldades na vida de cada um,no nosso povo, nas nossas comunidades, mas, por maiores que possam parecer, Deus nunca deixa que sejamos submergidos.Frente ao desânimo que poderia aparecer na vida, em quem trabalha na evangelização ou em quem se esforça por vivera fé como pai e mãe de família, quero dizer com força: Tenham sempre no coração esta certeza! Deus caminha a seu lado,nunca lhes deixa desamparados! Nunca percamos a esperança! Nunca deixemos que ela se apague nos nossos corações! O“dragão”, o mal, faz-se presente na nossa história, mas ele não é o mais forte. Deus é o mais forte, e Deus é a nossaesperança! É verdade que hoje, mais ou menos todas as pessoas, e também os nossos jovens, experimentam o fascínio detantos ídolos que se colocam no lugar de Deus e parecem dar esperança: o dinheiro, o poder, o sucesso, o prazer.Frequentemente, uma sensação de solidão e de vazio entra no coração de muitos e conduz à busca de compensações, destesídolos passageiros. Queridos irmãos e irmãs, sejamos luzeiros de esperança! Tenhamos uma visão positiva sobre a realidade.Encorajemos a generosidade que caracteriza os jovens, acompanhando-lhes no processo de se tornarem protagonistas daconstrução de um mundo melhor: eles são um motor potente para a Igreja e para a sociedade. Eles não precisam só decoisas, precisam sobretudo que lhes sejam propostos aqueles valores imateriais que são o coração espiritual de um povo,a memória de um povo. Neste Santuário, que faz parte da memória do Brasil, podemos quase que apalpá-los:espiritualidade, generosidade, solidariedade, perseverança, fraternidade, alegria; trata-se de valores que encontram a suaraiz mais profunda na fé cristã.

2.       A segunda postura: Deixar-se surpreender por Deus. Quem é homem e mulher de esperança – a grande esperançaque a fé nos dá – sabe que, mesmo em meio às dificuldades, Deus atua e nos surpreende. A história deste Santuário servede exemplo: três pescadores, depois de um dia sem conseguir apanhar peixes, nas águas do Rio Parnaíba, encontram algoinesperado: uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Quem poderia imaginar que o lugar de uma pesca infrutífera,tornar-se-ia o lugar onde todos os brasileiros podem se sentir filhos de uma mesma Mãe? Deus sempre surpreende, comoo vinho novo, no Evangelho que ouvimos. Deus sempre nos reserva o melhor. Mas pede que nos deixemos surpreender peloseu amor, que acolhamos as suas surpresas. Confiemos em Deus! Longe d’Ele, o vinho da alegria, o vinho da esperança, seesgota. Se nos aproximamos d’Ele, se permanecemos com Ele, aquilo que parece água fria, aquilo que é dificuldade, aquiloque é pecado, se transforma em vinho novo de amizade com Ele.

3.       A terceira postura: Viver na alegria. Queridos amigos, se caminhamos na esperança, deixando-nos surpreender pelovinho novo que Jesus nos oferece, há alegria no nosso coração e não podemos deixar de ser testemunhas dessa alegria. Ocristão é alegre, nunca está triste. Deus nos acompanha. Temos uma Mãe que sempre intercede pela vida dos seus filhos,por nós, como a rainha Ester na primeira leitura (cf. Est 5, 3). Jesus nos mostrou que a face de Deus é a de um Pai que nosama. O pecado e a morte foram derrotados. O cristão não pode ser pessimista! Não pode ter uma cara de quem parece numconstante estado de luto. Se estivermos verdadeiramente enamorados de Cristo e sentirmos o quanto Ele nos ama, o nossocoração se “incendiará” de tal alegria que contagiará quem estiver ao nosso lado. Como dizia Bento XVI: «O discípulo sabeque sem Cristo não há luz, não há esperança, não há amor, não há futuro” (Discurso inaugural da Conferência de Aparecida[13 de maio de 2007]: Insegnamenti III/1 [2007], 861).Queridos amigos, viemos bater à porta da casa de Maria. Ela abriu-nos, fez-nos entrar e nos aponta o seu Filho.Agora Ela nos pede: «Fazei o que Ele vos disser» (Jo 2,5). Sim, Mãe nossa, nos comprometemos a fazer o que Jesus nosdisser! E o faremos com esperança, confiantes nas surpresas de Deus e cheios de alegria. Assim seja.