O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

27 de maio de 2017

Pentecostes


A Festa de Pentecostes é um marco solido da fé cristã. A narrativa de Lucas no livro dos Atos dos Apóstolos (At 2,1-13) revela que os discípulos estavam reunidos no mesmo local dos encontros anteriores (os discípulos se reuniam de modo secreto e escondido, pois temiam perseguições por estarem envolvidos com Jesus, que fora condenado como malfeitor).
Pentecostes é o evento em que os discípulos perdem o medo e encontram através da força do Espírito Santo a coragem de testemunhar o Evangelho e assumir todos os riscos inerentes à vocação.
As línguas de fogo representam a força do alto, a intervenção divina e a luz do Espírito Santo que ilumina, aquece e encoraja. Pode-se dizer que as línguas de fogo são a unção de Deus para a nova missão dos discípulos. Eles até agora reunidos a portas fechadas, deixam o lugar e partem corajosamente para anunciar a missão, a paixão e a ressureição de Jesus. (Frei Isidoro Mazzarolo)


Quando vejo esta imagem, tão divulgada pela igreja nesta época de Pentecostes, fico me perguntando: se Maria estava entre os apóstolos, assim como algumas outras mulheres que seguiram Jesus  e também como eles receberam a efusão do Espírito Santo, e não deixaram de ser mulheres, porque então resolveram ir além das decisões de Deus e privar as mulheres do sacerdócio ? Será que o Espírito de Deus escolheu em quem se manifestar? Tenho pavor de incoerências.
Pedro pelo menos teve a humildade de admitir em uma outra situaçãoque se o espírito havia se derramado sobre os "impuros", não seria ele que faria objeção. Mas parece que o magistério atual prefere outro caminho... 


Que o Espírito Santa traga Luz, muita Luz para que se possa ter um novo caminho mais inclusivo e genuinamente Cristão.
 Que ele nos dê coragem neste momento difícil de nossa história.

26 de maio de 2017

Um pouco de luz para entender o momento que atravessamos

Ao término de um período de decadência sobre vêm o ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge. Há movimento, mas este não é gerado pela força... O movimento é natural, surge espontaneamente. Por essa razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O velho é descartado, e o novo ê introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando daí, portanto, nenhum dano.  I Ching                                   
O Físico e autor de alguns livros sobre  Ciência e espiritualidade, Fritjof Capra no seu livro  “O ponto de mutação’, nos fala de  três transições que estão abalando nossas vidas e transformando  profundamente o sistema social, econômico e político em todo mundo.

1- “A primeira, e talvez a mais profunda, deve-se ao lento, relutante, mas inevitável declínio do patriarcado”. Segundo ele, o patriarcado tem sido o único sistema “que, até data recente, nunca tinha sido abertamente desafiado em toda a história documentada, e cujas doutrinas eram tão universalmente aceitas que pareciam constituir leis da natureza; na verdade, eram apresentadas como tal. Hoje, porém, a desintegração do patriarcado tornou-se evidente. O movimento feminista é uma das mais fortes correntes culturais do nosso tempo, e terá um profundo efeito sobre a nossa futura evolução. ”

2- “A segunda transição nos é imposta pelo declínio da era do combustível fóssil. Essa época será marcada pela transição para uma era solar, acionada por energia renovável oriunda do Sol e envolverá transformações profundas em nossos sistemas econômicos e políticos.
3- A terceira transição está relacionada com valores culturais e envolve o que chamamos de “mudança de paradigma”.
“O paradigma ora em transformação dominou nossa cultura durante muitas centenas de anos, ao longo dos quais modelou nossa moderna sociedade ocidental e influenciou significativamente o resto do mundo.”

A concepção do universo como máquina está dando lugar a uma nova concepção do universo como um sistema vivo e isso já pode ser percebido claramente na medida em que crescem as manifestações e soluções que vêm das minorias criativas e que respondem aos desafios do nosso tempo.

“A transformação que estamos vivenciando agora poderá muito bem ser mais dramática do que qualquer das precedentes, porque o ritmo de mudança em nosso tempo é mais célere do que no passado, porque as mudanças são mais amplas, envolvendo o globo inteiro, e porque várias transições importantes estão coincidindo.
A crise atual, portanto, não é apenas uma crise de indivíduos, governos ou instituições sociais, é uma transição de dimensões planetárias. Como indivíduos, como sociedade, como civilização e como ecossistema planetário, estamos chegando a um momento decisivo.”
“Durante essa fase de reavaliação e renascimento cultural, será importante minimizar as agruras, a discórdia e as rupturas que inevitavelmente ocorrem em períodos de grandes mudanças sociais, a fim de tornar a transição tão indolor quanto possível. Portanto, é essencial que se vá além dos meros ataques a determinados grupos ou instituições sociais, mostrando que suas atitudes e comportamento refletem um sistema de valores que sustenta toda a nossa cultura mas está ficando agora obsoleto.

As instituições sociais dominantes recusar-se-ão a entregar seus papéis de protagonistas a essas novas forças culturais, mas continuarão inevitavelmente a declinar e a desintegrar-se, e as minorias criativas poderão estar aptas a transformar alguns dos antigos elementos
Será necessário reconhecer e comunicar amplamente o fato de que as mudanças sociais correntes são manifestações de uma transformação cultural muito mais ampla e inevitável. Somente então estaremos aptos a abordar a espécie de transição de cultura harmoniosa e pacífica descrita num dos mais antigos livros de sabedoria da humanidade, o I Ching chinês, ou O livro das mutações:
“O movimento é natural, surge espontaneamente. Por essa razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O antigo é descartado, e o novo é introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando daí, portanto, nenhum dano.”


21 de maio de 2017

Marxismo e Cristianismo

Maurício Tupinambá Fernandes de Sá
A teoria marxista surgiu da reflexão crítica e científica sobre os mais importantes movimentos de trabalhadores surgidos na história e é, sem dúvida, a teoria mais relevante para entender a economia capitalista e a possibilidade de emancipação dos oprimidos. Iniciado pelo filósofo alemão Karl Marx, o marxismo continuou sendo desenvolvido e aperfeiçoado por outros pensadores, como Friedrich Engels, Rosa Luxemburgo, Wladimir Lênin, Leon Trotski, Antônio Gramsci, Georg Lukács, Theodor Adorno, Herbert Marcuse e Ernst Bloch. A maior vantagem do marxismo, como teoria, é que ele é um movimento crítico e, por isso, ele renasce com nova força da reflexão sobre seus próprios erros e permite que continue sendo interpretado e experimentado com maior rigor e eficácia. O marxismo é um pensamento em movimento, diferente do positivismo que é estático e conservador.
O Cristianismo, maior expressão religiosa do ocidente, surgiu antes do capitalismo, e baseia sua fundamentação na vida e ação de Jesus Cristo. O ideal da vida cristã é a Partilha, a Comunhão. Este é o sentido da Comunidade, expressando a idéia de uma vida em Comum-unidade com os outros. Não cabe ali a Propriedade Privada, a exploração e a desigualdade social. Por defender o ideal de uma sociedade onde o importante é o Comum, aquilo que é de todos, Jesus Cristo , Filho de Deus , foi Crucificado pelos poderosos de sua época, os Romanos e Fariseus, e, inclusive, os sumo-sacerdotes (religiosos que não comungavam dos ideais cristãos).
Entretanto, em torno do século VI, no reinado de Constantino, o Cristianismo foi utilizado como ideologia a serviço da dominação pelo Império Romano. Os senhores feudais negaram o Cristianismo e constituíram sociedades injustas, instrumentalizando ideologicamente a crença cristã para integrá-la politicamente ao Estado. Mais tarde, com o advento do capitalismo, os burgueses tentaram conciliar sua forma de vida parasitária com a fé cristã. Entretanto, os capitalistas mais autênticos se assumiram como liberais e se contrapuseram à Igreja, na tentativa de superar o Cristianismo e acabar com a hegemonia do feudalismo.
Podemos afirmar que tanto os capitalistas que se "autodenominam cristãos" como aqueles que se identificam como liberais, negam a vida em comunhão e pregam a acumulação pessoal com o sacrifício da maioria. Seu combate é o mesmo, a luta contra o comunismo, termo que, até hoje, utilizam para confundir as pessoas. E essa é uma luta política, como não poderia deixar de ser, embora os opressores continuem afirmando que só eles é que podem fazer "política". Como negar que o cristianismo é político se o maior líder de uma Igreja cristã é chefe de um Estado, o Vaticano, que em toda sua história organiza movimentos políticos em todo o mundo? Cristo foi morto como "preso político", por defender idéias que contestavam a estrutura injusta da sociedade. Assim, todo cristão que vive o evangelho de forma coerente, desagrada àqueles que oprimem o povo.
Há mais de um século, o marxismo passou a ser a principal expressão do pensamento da esquerda mundial, tendo em vista que a teoria liberal se converteu em ideologia do capitalismo. Esta, além de ser anterior ao marxismo, não consegue apresentar perspectivas à esmagadora maioria da população, principalmente aos problemas da exclusão social e da destruição ambiental. Onde estariam os liberais cristãos? Teoricamente sua base é contraditória e conflituosa. Sua ação é, em sua maioria, disfarçada, secreta e geralmente hipócrita. A maioria dos capitalistas, não se revela como liberal (inclusive partidos deixam de declarar publicamente como liberais) para não assustar a população, reunindo-se em torno de movimentos empresariais, claramente opostos ao cristianismo e, mesmo assim, mantendo a aparência de "cristãos devotos" na sociedade.
Como o liberalismo passou a legitimar a opressão capitalista, para manter os privilégios de classe, muitos liberais negam o saber ao povo, se apresentando, eles mesmos, como estudiosos e "colecionadores" de obras do marxismo, mas reprimindo e discriminando a leitura marxista à população em geral. Atualmente, é freqüente verificarmos que os mesmos que estiveram a serviço da ditadura militar, que mataram e torturam pessoas para manter os capitalistas no poder, vêm a público combater o marxismo. Aliás, assumem a mesma prática dos que mataram Cristo: não querem que o povo conheça realmente o ideal cristão, assustando as pessoas sobre teorias que possam alterar a ordem que favorece aos poderosos. Da mesma forma que reprimiram a leitura do marxismo no período de ditadura militar, prendendo, perseguindo e assassinando marxistas no Brasil. São esses os liberais brasileiros que se apresentam como defensores da democracia.
Partindo do entendimento do significado do marxismo e do cristianismo, podemos verificar que as duas correntes de pensamento, em sua origem, convergem para o mesmo sentido: a vida em comum, o comunismo. O que não é possível é ser capitalista e cristão ao mesmo tempo e os liberais demonstram isso claramente em sua teoria, que surgiu, objetivamente, para combater o cristianismo, em torno do século XVII. Os equívocos de algumas experiências socialistas com relação ao cristianismo são evidentes, assim como foram contraditórias com o próprio marxismo, instrumentalizado para legitimar o poder de Estados autoritários e burocratizados. Mas, o marxismo permanece vivo, lado a lado com o Cristianismo, com inúmeros Cristãos Marxistas, adeptos da Teologia da Libertação, o que não ocorre com o liberalismo.
Como o marxismo estimula o pensamento livre, sua leitura e debate devem ser oportunizados a todos, sem distinção. Através do marxismo tornou-se possível aos trabalhadores compreender a exploração capitalista, permitindo a sua mobilização e organização social contra os opressores, numa perspectiva de construção de uma sociedade socialista, sem classes e desigualdades sociais, coerente com o propósito Cristão de que "todos tenham vida e a tenham em abundância".

Ascensão





Homens da Galiléia, por que ficais aí a olhar para o céu?
Ascensão Simples, sem complicações, basicamente ele nos pediu que: 

Amássemos como Ele nos ama e que o anunciássemos a toda a humanidade. Para isso não são precisos dogmas, documentos, hierarquias, tronos, palácios, nem mesmo templos. 
A imagem d’Ele está revelada em nós que somos a expressão do amor do Pai.
"Sereis minhas testemunhas"
É desse Jesus, simples e descomplicado, que temos sido testemunhas ?
”8....descerá sobre vós o Espírito Santo e vos dará força; e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e Samaria e até os confins do mundo.9.Dizendo isso elevou-se da (terra) à vista deles e uma nuvem o ocultou aos seus olhos...
10. Enquanto o acompanhavam com seus olhares, vendo-o afastar-se para o céu, eis que lhes apareceram dois homens vestidos de branco, que lhes disseram:
11. Homens da Galiléia, por que ficais aí a olhar para o céu?
Esse Jesus que acaba de vos ser arrebatado para o céu voltará do mesmo modo que o vistes subir para o céu. (At 1,8-11)

13 de maio de 2017

Isto Também Passará - uma história Sufi


Um dervishe, depois de uma árdua e longa viagem através do deserto, chegou por fim à civilização. O povoado se chamava Colinas Arenosas e era quente e seco. Não havia muito verde, exceto feno para o gado e alguns arbustos. As vacas eram o principal meio de vida das pessoas de Colinas Arenosas. O dervishe perguntou educadamente a alguém que passava se havia algum lugar onde poderia encontrar comida e abrigo para aquela noite.
- Bem, disse o homem coçando a cabeça - não temos um lugar assim no povoado, mas estou certo de que Shakir ficará encantado de lhe brindar com sua hospitalidade esta noite.
Então o homem indicou o caminho da fazenda de propriedade de Shakir, cujo nome significa "o que agradece constantemente ao Senhor".
No caminho até a fazenda, o dervishe parou perto de um pequeno grupo de anciões que estavam fumando cachimbo e eles confirmaram a direção. Eles disseram que Shakir era o homem mais rico da região.
Um dos homens disse que Shakir era dono de mais de mil vacas.
- E isso é maior do que a riqueza de Haddad, que vive no povoado ao lado.
Pouco tempo depois o dervishe estava parado em frente a casa de Shakir a admirando. Shakir, que era uma pessoa muito hospitaleira e amável, insistiu para que o dervishe ficasse por alguns dias em sua casa.
A mulher e as filhas de Shakir eram igualmente amáveis e deram o melhor para o dervishe. Inclusive, ao final de sua estadia, lhe deram uma grande quantidade de comida e água para sua viagem.
No seu caminho de volta para o deserto, o dervishe não conseguia parar de se perguntar o significado das últimas palavras de Shakir.
No momento da despedida o dervishe havia dito:
- Dê Graças a Deus pela riqueza que tens.
- Dervishe - havia respondido Shakir - não se engane pelas aparências, porque isto também passará.
Durante o tempo em que havia passado no caminho Sufi, o dervishe havia compreendido que qualquer coisa que ouvisse ou visse durante sua viagem lhe oferecia uma lição para aprender, e portanto, valia a pena considerá-la. Além de tudo, essa era a razão pela qual havia feito a viagem, para aprender mais.
As palavras de Shakir ocuparam seus pensamentos e ele não estava seguro de ter compreendido completamente o seu significado.
Quando estava sentado sob a sombra de um arbusto para rezar e meditar, recordou do ensinamento Sufi sobre guardar silencio e não se precipitar em tirar conclusões para finalmente alcançar a resposta. Quando chegasse o momento, compreenderia, já que havia sido ensinado a permanecer em silêncio e sem fazer perguntas. Para tanto, fechou a porta dos seus pensamentos e submergiu sua alma em um estado de profunda meditação.
E assim se passaram mais cinco anos, viajando por diferentes terras, conhecendo pessoas novas e aprendendo com suas experiências no caminho. Cada nova aventura oferecia uma lição a ser aprendida. Entretanto, como requeria o costume Sufi, permanecia em silêncio, concentrado nas ordens do seu coração.
Um dia, o dervishe voltou a Colinas Arenosas, o mesmo povoado onde havia passado alguns anos antes. Se lembrou de seu amigo Shakir e perguntou por ele.
- Está vivendo no povoado ao lado, a dez milhas daqui. Agora trabalha para Haddad - respondeu um homem do povoado.
O dervishe lembrou surpreendido que Haddad era o outro homem rico da região. Contente com a idéia de voltar a ver Shakir outra vez, se apressou para ir ao povoado vizinho. Na maravilhosa casa de Haddad, o dervishe foi bem recebido por Shakir, que agora parecia muito mais velho e estava vestido em andrajos.
- O que lhe aconteceu? - quis saber o dervishe.
Shakir respondeu que uma enchente três anos antes o havia deixado sem vacas e sem casa; assim ele e sua família se tornaram empregados de Haddad, que sobreviveu à enchente e agora desfrutava da posição de homem mais rico da região. Entretanto, esta alteração na sorte não havia mudado o caráter amistoso e atencioso de Shakir e de sua família.
Cuidaram amavelmente do dervishe na sua cabana durante os dois dias e lhe deram comida e água antes dele sair.
Na despedida, o dervishe disse:
- Sinto muito pelo que aconteceu com você e sua família. Mas sei é que Deus tem um motivo para aquilo que faz..
- Mas não se esqueça, isto também passará.



A voz de Shakir ressoou como um eco nos ouvidos do dervishe. O rosto sorridente do homem e seu espírito tranqüilo não abandonavam seu pensamento.
- O que ele quer dizer com esta frase desta vez?
O dervishe sabia agora que as últimas palavras de Shakir na sua visita anterior se anteciparam às mudanças que ocorrerem. Mas dessa vez, se perguntava o que poderia justificar um comentário tão otimista. Assim deixou a frase de lado outra vez, preferindo esperar pela resposta.
Passaram meses e anos, e o dervishe, que estava ficando velho, continuou viajando sem nenhuma intenção de parar.
Curiosamente, suas viagens sempre o levavam de volta ao povoado onde vivia Shakir. Assim sendo, demorou sete anos para voltar a Colinas Arenosas e Shakir estava rico outra vez. Agora vivia na casa principal da propriedade de Haddad e não na pequena cabana.
- Haddad morreu há dois anos - explicou Shakir - e, como não tinha herdeiro, decidiu deixar sua fortuna para mim como recompensa dos meus leais serviços.
Quando estava terminando sua visita, o dervishe se preparou para a viagem mais importante de sua vida: cruzaria a Arábia Saudita para fazer sua peregrinação a pé até Meca, uma antiga tradição entre seus companheiros. A despedida de seu amigo não foi diferente das outras vezes. Shakir repetiu sua frase favorita:
- Isto também passará.
Depois da peregrinação, o dervishe viajou à Índia. Ao voltar a sua terra natal, Pérsia, decidiu visitar Shakir mais uma vez para ver o que havia acontecido com ele. Assim, mais uma vez se pós em marcha para Colinas Arenosas. Mas em vez de de encontrar seu amigo Shakir, lhe mostraram uma humilde tumba com a inscrição "Isto também passará". O dervishe ficou ainda mais surpreendido do que das outras vezes, quando o próprio Shakir havia pronunciado estas palavras.
- As riquezas vem e as riquezas se vão - pensou o dervishe - mas, como pode trocar um túmulo?
A partir de então o dervishe adquiriu o costume de visitar a tumba de seu amigo de tantos anos e passava algumas horas meditando na morada de Shakir. Entretanto, em uma de suas visitas o cemitério e a tumba haviam desaparecido, arrasados por uma enchente. Agora, o velho dervishe havia perdido o único vestígio deixado por um homem que havia marcado tão excepcionalmente as experiências de sua vida. O dervishe permaneceu durante horas nas ruínas do cemitério, olhando o chão fixamente. Finalmente, levantou a cabeça em direção ao céu e então, como se houvesse descoberto um significado mais elevado, abaixou a caberá em sinal de confirmação e disse:
- Isto também passará.
Finalmente o dervishe ficou muito velho para viajar, decidindo se fixar e viver tranqüilo e em paz pelo resto de sua vida.
Os anos se passaram e o ancião se dedicava a ajudar a quem se acercava dele para os quais aconselhava e a compartilhar suas experiências com os jovens. Vinha gente de todas as partes para beneficiar-se de sua sabedoria. Finalmente, sua fama chegou até o grade conselheiro do rei, que casualmente estava buscando alguém com grande sabedoria.
O fato era que o rei desejava que lhe fizessem um anel. O anel teria de ser especial: devia ter uma inscrição de tal forma que quando o rei se sentisse triste, olhasse o anel e ficaria contente e se estivesse feliz, ao olhar o anel se entristeceria.
Os melhores joalheiros foram contratados e muitos homens e mulheres se apresentaram para dar sugestões sobre o anel, mas o rei não gostava de nenhuma. Então o conselheiro escreveu para o dervishe explicando a situação, pedindo ajuda e o convidando para ir ao palácio. Sem abandonar sua casa, o dervishe enviou sua resposta.
Poucos dias mais tarde, um anel foi feito com uma esmeralda e foi entregue ao rei. O rei, que havia estado deprimido por vários dias, mal o recebeu, botou o anel no dedo e olhando-o, deu um suspiro de decepção.
Logo começou a sorrir e, pouco depois, ria às gargalhadas.
No anel que usava estavam escritas as palavras "Isto também passará".