O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

27 de fevereiro de 2010

GUERREIRO DA PAZ

Nestes momentos difíceis de ajustamento para nossa civilização
é hora de convocar o conselho dos anciãos
e colocar em alerta os Guerreiros da Paz.

http://www.youtube.com/watch?v=DhoEb7nZ9sQ





GUERREIRO DA PAZ

Eu chamo a força, eu chamo a força
eu chamo a força
força das pedras para me firmar
Eu chamo a terra, eu chamo a terra
eu chamo a terra
eu chamo a terra para me enraizar
Eu chamo o vento, eu chamo o vento
eu chamo o vento
eu chamo o vento vem me elevar
Eu chamo o fogo, eu chamo o fogo
eu chamo o fogo
eu chamo o fogo para me purificar
Eu chamo a Lua, chamo o Sol
chamo as estrelas
Chamo o universo para me iluminar
Eu chamo a água, chamo a chuva
e chamo o rio
Eu chamo todos para me lavar
Eu chamo o raio, o relâmpago e o trovão
Eu chamo todo o poder da criação
Eu chamo o mar, chamo o céu e o infinito
Eu chamo todos para nos libertar
Eu chamo Cristo, eu chamo Budha
Eu chamo Krishna
Eu chamo a força de todos orixás
Eu chamo todos com suas forças divinas
Eu quero ver o universo iluminar
Eu agradeço pela vida e a coragem
Ao universo pela oportunidade
E a minha vida eu dedico com amor
Ao sonho vivo da nossa humanidade
Sou mensageiro, sou cometa, eu sou indígena
Eu sou filho da nação do Arco Íris
Com meus irmãos eu vou ser mais um
guerreiro
Na nobre causa do Inka Redentor
Eu sou guerreiro, eu sou guerreiro e vou lutando
A minha espada é a palavra do amor
O meu escudo é a bondade no meu peito
E o meu elmo são os dons do meu senhor
Eu agradeço a nossa Mãe e ao nosso Pai
E aos meus irmãos por todos me ajudar
A minha glória para todos eu entrego
Porque nós todos somos um nesta união
Ñdarei a sã
ñdarei a sã
ñdarei a sã
Desde o principio
todos nós somos irmãos!
Orei ouá
Orei ouá
Orei ouá
Viva o Poder de todo o universo!

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WARRIOR OF PEACE
I call the force, I call the force
I call the force
forces of the stones to firm me
I call the earth, I call the earth
I call the earth
I call the earth to root me
I call the wind, I call the wind
I call the wind
I call the wind comes to rise me up
I call the fire, I call the fire
I call the fire
I call the fire to become purified
I call the Moon, I call the Sun
I call the stars
I call the universe to illuminate me
I call the water, I call the rain
and I call the river
I call all to wash me
I call the ray, the lightning and the thunder
I call all the power of the creation
I call the sea, I call the sky and the infinite
I call all to free us
I call Christ, I call Budha
I call Krishna
I call the force of all Orixás
I call all with their divine forces
I want to see the universe light up
I thank for the life and the courage
To the universe for the opportunity
And my life I dedicate with love
To our humanity's alive dream
I am messenger, I am comet, I am indigenous
I am son of the nation of the rainbow
With my siblings I will be one more
warrior
In the noble cause of Inka Redentor
I am warrior, I am warrior and I am going struggling
My sword is the word of the love
My shield is the kindness in my chest
And my helmet is my gentleman's talents
I thank our Mother and to our Father
And to all my brothers for to help me
My glory for all I give
Because us all are one in this union
Ñdarei a sã
ñdarei a sã ñdarei a sã
ñdarei a sã
From the begining
all of us are brothers!
Orei ouá
Orei ouá
Orei ouá
Live the Power of the whole universe!

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GUERRERO DE PAZ
El que une la verdad...
Llamo la fuerza, llamo la fuerza
llamo la fuerza
fuerza de las piedras para firmarme
Llamo la terra, llamo la terra
llamo la terra
llamo la tierra para enraizarme

Llamo el viento, Llamo el viento
Llamo el viento
Llamo el viento vem a elevarme
Llamo el fuego, Llamo el fuego
Llamo el fuego
Llamo el fuego para purificarme

Llamo la luna, llamo el Sol
llamo las estrelas
Llamo el universo para iluminarme
Llamo el agua, llamo la lluvia
y llamo el rio
los llamo a todos para lavarme

Llamo el rayo, el relámpago y el trueno
Llamo todo el poder de la creacion
Llamo el mar, llamo el cielo y el infinito
Llamo a todos para libertarnos

Yo llamo Cristo, llamo a Budha
llamo a Krishna
Llamo la fuerza de los Orixás
Llamo a todos con sus fuerzas divinas
Yo quiero ver el universo iluminar

Yo agradezco por la vida y el corage
Al universo por la oportunidad
Y mi vida dedico con amor
al sueño vivo de nuestra humanidad

Soy mensajero, soy cometa, soy indígena
Soy hijo de la nación del Arco Íris
con mis hermanos voy a ser un guerrero más
En la noble causa del Inca redentor

Yo soy guerrero, soy guerrero y voy luchando
Mi espada es la palabra del Amor
Mi escudo es la bondad en mi pecho
Y mi casco son los dones de mi señor

Yo agradezco a nuestra Madre y a nuestro Padre
Y a mis hermanos por ayudarme
Mi gloria para todos yo entrego
Porque todos somos uno dentro de esta unión

Ñdarei a sã
ñdarei a sã
ñdarei a sã
Desde el principio
todos somos hermanos!
Orei ouá
Orei ouá
Orei ouá
Viva el Poder de todo el universo!

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سلحشور صلح ال qué unë در verdad من اسمش زور ، من اسمش قدرت من اسمش قدرت نیروی سنگ ها به من ثابت من اسمش زمین ، من اسمش زمین من اسمش زمین من تماس بگیرید برای دریافت زمین ریشه
من اسمش باد ، من اسمش باد من اسمش باد من اسمش باد آمد بلند من تا من اسمش آتش من اسمش آتش من اسمش آتش من اسمش را به آتش مرا پاک
من اسمش ماه ، من خورشید ستاره کهکشان من اسمش را به من تعلیم من اسمش آب تماس ، من تماس با باران و من اسمش تمام رودخانه برای شستن
من اسمش رعد و برق ، رعد و برق و غرش من اسمش تمام قدرت خلقت من اسمش دریا ، بینهایت آسمان تماس بگیرید و من اسمش را به هر کس آزاد است؟
من اسمش مسیح ، من اسمش را بودا من اسمش کریشنا من اسمش قدرت تمام خدایانشان من اسمش همه نیروهای خود را الهی من می خواهم برای دیدن نور جهان
من از شما سپاسگزارم به زندگی و جهان شده توسط شجاعت و فرصت را وقف زندگی من دوست دارم زندگی رویای انسانیت ما
من فرستاده ، من مرتکب ، من هند من پسر رنگینکمان کشور با برادران من من بیشتر جنگجو در علت اصیل آمرزنده اینکا
من قوی ، من قوی بود و من مبارزه با شمشیر من این است که کلمه ای از عشق من این است سپر خوبی در قفسه سینه ام و من کلاه از هدایای پروردگار من
Ndari Ndari Ndari صدا صدا صدا از همان آغاز ما همه برادران! من دعا کنم دعا دعا ÖÜå ÖÜå ÖÜå زنده باد قدرت تمام جهان!

21 de fevereiro de 2010

Um novo tempo - Quaresma- 40 dias no Deserto


No Ocidente, as Igrejas cristãs mais antigas começam os 40 dias de retiro da Quaresma, em preparação mais próxima para as celebrações anuais da Páscoa.
É mais do que nunca o que Paulo chamava de "tempo oportuno e dia favorável" para retomarmos nosso propósito de conversão e transformação interior e social.

Antigamernte, se compreendia isso de forma pesada e negativa. (por exemplo, como tempo de jejuns, sacrifícios e até mortificações).

Hoje, o compreendo como tempo de alegria e de preparação para a festa pascal que já é festa interior e no coração.

Fico feliz que as sete Igrejas cristãs do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) estejam lançando hoje a 3a Campanha da Fraternidade Ecumênica com o tema "Economia e Vida". E o lema: "Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro".
Que isso nos faça pensar e planejar bem concretamente em nossas vidas pessoais e familiares como organizar melhor uma economia de partilha como sinal e expressão desta caminhada pascal.(D.Marcelo Barros, Mosteiro da Anunciação-Goias)



"Cheio do Espírito Santo, voltou Jesus do Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto, onde foi tentado pelo demônio durante quarenta dias. " (Lc. 4, 1-2a).

Também nós queremos que o Espírito Santo nos conduza ao deserto. Em toda a tradição bíblica e também dos primeiros séculos da Igreja, o deserto é um lugar especial de encontro com Deus. "Por isso a atrairei, conduzi-la-ei ao deserto e falar-lhe-ei ao coração" (Os. 2, 16).

Ir ao deserto com Jesus durante esse tempo de quaresma, ou outro tempo que você mesmo eleger (não necessariamente a quaresma), é nos colocarmos no firme propósito de termos um encontro com Deus e com nossa própria verdade. O deserto não é um lugar, mas uma disposição espiritual.

Os "demônios" que precisamos enfrentar estão, antes de tudo, dentro de nós. São nossos próprios traços de personalidade, inclinações, atitudes que precisam ser reconciliados ou até mesmo vencidos, exorcizados para vivermos debaixo da Vontade de Deus.

Essa batalha se trava do decorrer de toda nossa vida. Sempre precisaremos de mudança, conversão. Ninguém se sinta pronto por ter percorrido um determinado trecho de sua senda espiritual. Sempre haverá a necessidade de se colocar novamente a caminho, de se confrontar, de mudar, de crescer. É tarefa de uma vida inteira.

É preciso ainda lembrar que sem a graça de Deus toda ascese (disciplina espiritual) é vã. A iniciativa é de Deus. É o Espírito Santo quem conduz Jesus ao deserto. "Porque é Deus quem segundo o seu beneplácito, realiza em vós o querer e o executar" (Flp. 2, 13).
Pe. Sérgio Luis e Silva (Ig S. José - BH. MG )

12 de fevereiro de 2010

Cinco anos sem Irmã Doroty- até quando seremos coniventes com a impunidade?


Cinco anos passaram desde aquele fatídico sábado em que Rayfran e Clodoaldo, empregados de Tato, cruzaram o caminho da Irmã Dorothy, não para cumprimentá-la, mas para executar o sinistro plano, há tempo concebido pelo consórcio do crime, e cumprir o nefasto papel de matar a Irmã que dedicou toda a sua vida aos pobres.
Os pobres de hoje não são apenas uns explorados e oprimidos. São excluídos, expulsos da sociedade e da terra por serem considerados "supérfluos" (cf. DAp 65). Irmã Dorothy fez a opção de sua vida exatamente por essas pessoas, por essas famílias "sem eira nem beira", desprezadas e maltratadas, sem perspectivas num mundo em que perderam sua pátria.
Foi aos pobres, que Deus assegurou seu amor incondicional e preferencial. As palavras do profeta Jeremias calaram fundo no coração de Dorothy: "Ponde em prática a justiça e o direito, livrai o oprimido das mãos do opressor, nunca prejudiqueis ou exploreis o migrante, o órfão e a viúva nem jamais derrameis sangue inocente no país" (Jer 22,3). Dorothy não apenas acompanhou as famílias de Anapu e da Transamazônica na busca de seus direitos e defendeu seus interesses, peregrinando de repartição em repartição, procurando falar com prefeitos, vereadores, deputados, senadores. Dorothy fez e foi muito mais: Ela amou! E esse amor fez vibrar cada uma das fibras de seu coração. Ela foi mãe, foi irmã, foi filha de seu povo! Dorothy nos lembra a passagem tão sugestiva na primeira carta de São Paulo aos Tessalonicenses: "Apresentamo-nos no meio de vós cheios de bondade, como u'a mãe que acaricia os seus filhinhos. Tanto bem vos queríamos que desejávamos dar-vos não somente o evangelho de Deus, mas até a própria vida, de tanto amor que vos tínhamos" (1 Tes 2,7-8).
Naquela manhã de sábado, 12 de fevereiro de 2005, ela testemunhou "o evangelho de Deus", derramando o seu próprio sangue. Foi morta porque amou sem medida, foi trucidada porque entendeu que seu lugar era "ao lado dessas pessoas constantemente humilhadas" [1] foi assassinada porque abraçou "a justiça e o direito" e lutou para livrar "o oprimido das mãos do opressor" (Jer 22,3), foi eliminada do meio do povo pobre porque contrariou os interesses e ambições de "gente que se considera poderosa", como ela mesma costumava expressar-se.
Dorothy viveu em vida a opção pelos pobres sem deixar-se intimidar ou constranger. Com a sua morte, porém, Dorothy ultrapassou todos os limites e fronteiras. Sacudiu o mundo, descerrando a face ensanguentada da Amazônia, fazendo ecoar os gritos e revelando as dores que golpeiam os povos que aqui vivem.
Cinco anos passaram! Cinco anos, também repletos de tramas e trâmites judiciais. Prisões efetuadas com grande alarde, sentenças condenatórias solenemente proferidas e com a mesma solenidade anuladas, pedidos de habeas corpus deferidos e liberdade provisória concedida. Sempre novas versões do crime, chegando até ao cúmulo absurdo de transformar a vítima em ré, alegando legítima defesa.
Há poucos dias um dos acusados é preso outra vez [2] . Foi condenado a 30 anos e absolvido em um segundo julgamento. Agora outro recurso consegue anular o veredicto anterior e o fazendeiro recebe novamente voz de prisão. E a imprensa divulga o fato como se fosse a prova mais convincente de que a Justiça funciona. Só tem um detalhe! Nós todos já estamos saturados de tais notícias. Em breve, algum advogado experto vai achar outra brecha na legislação e o homem conseguirá mais um alvará de soltura para acrescentar à sua coleção. O mesmo se diga do tal desaforamento anunciado agora [3]. Precisava cinco anos para chegar a essa conclusão?!
E o consórcio do crime? Nada mais tem a temer! A poeira há tempo sentou. Afinal, já há quem responde pelo homicídio! Por que procurar outros para submetê-los a processos complicados? Por que investigar a quem já não quer lembrar-se de nada? E aqueles que de longa data prepararam o terreno e o ambiente para que a irmã fosse morta? Agora negam tudo! Há pessoas que andaram de cima para baixo com a Dorothy e com ela comeram farofa na casa da Prelazia. Hoje estão do outro lado! Habilitaram-se a jogar no time adversário! É o salmo 41 bem atualizado: "Até meu amigo, em quem eu confiava, que comia do meu pão, levantou o calcanhar contra mim" (Sl 41 (40),10).
Neste ano de 2010, o mês de fevereiro, em que Irmã Dorothy foi assassinada, ganha mais uma razão para tornar-se histórico. A Amazônia que Dorothy tanto defendeu e pela qual doou sua vida, recebe mais um golpe, desta vez de proporções que ainda nem sequer podemos vislumbrar. O Presidente da República me prometeu pessoalmente [4] a continuação do diálogo sobre o projeto Belo Monte. No dia primeiro deste mês o Ibama tornou pública a licença prévia para que o Xingu fosse barrado. 1522 km2 de destruição à vista: 516 km2 de área inundada e 1006 km2 de área deteriorada porque faltará água!
Todas as 40 condicionantes que a Licença Prévia elenca para serem observadas pela empresa que sairá vitoriosa no leilão, nada mais são que uma confissão pública do Governo que o projeto, se for executado, terá consequências desastrosas. Ao exigir um bilhão e meio de reais em projetos para mitigar os efeitos, o próprio Governo admite de antemão que Belo Monte causará um terrível e irreversível impacto sobre a Amazônia. Onde já se viu tanto esmero para atenuar sequelas antes de iniciar a obra? É a prova cabal de que o próprio Governo sabe que está dando um tiro no escuro. Até esta data, o Ibama nem sequer conseguiu identificar a abrangência e intensidade dos impactos. Como esse órgão então pode realmente atestar a viabilidade de Belo Monte? Lamentavelmente, quem sofrerá os trágicos efeitos não serão os tecnocratas em Brasília e políticos míopes, mas os povos desta região da Amazônia. O Xingu nunca mais será o mesmo. O solo será danificado, a floresta devastada e das águas turvas e mortas emergirão apenas os esqueletos esbranquiçados das outrora frondosas árvores.
É a política do rolo compressor, é a tática do fato consumado, é o método do autoritarismo que não aceita contestação!
E Dorothy, no seu túmulo, chora a desgraça anunciada!
Mas não deixa de encorajar-nos na luta em favor da vida contra projetos de morte. Nosso caminho é aquele traçado pelo Evangelho. Somos enviados por Jesus para anunciar a Boa Nova aos pobres e denunciar o que se opõe ao Evangelho da Vida, para quebrar as algemas da opressão e tirania, para defender o lar que Deus criou para todos nós e as futuras gerações, e proclamar um ano de graça do Senhor (cf. Lc 4,18-19).
Amém! Marána thá! Vem Senhor Jesus!
Anapu, 12 de fevereiro de 2010
Erwin Kräutler, Bispo do Xingu

6 de fevereiro de 2010

A Igreja no abismo !!! ? !!!

.
A igreja precisa de uma tríplice reforma:
teológico-catequética, espiritual e pastoral


P. Henri Boulad, sj *


[O jesuíta egípcio mais destacado nos âmbitos eclesial e intelectual, Henri Boulad, lança um SOS à Igreja de hoje numa carta dirigida a Bento XVI. A missiva foi transmitida através da Nunciatura no Cairo. O texto circula nos meios eclesiais de todo o mundo].

Santo Padre:
Atrevo-me a dirigir-me diretamente a Vós, pois o meu coração sangra ao ver o abismo no qual se está precipitando a nossa Igreja. Certamente desculpará a minha franqueza filial, inspirada na "liberdade dos filhos de Deus" à qual nos convida São Paulo, e pelo meu amor apaixonado pela Igreja.
Agradecer-lhe-ia também que saiba desculpar o tom alarmista desta carta, pois creio que "são menos cinco" e que a situação não pode esperar mais.
Permita-me em primeiro lugar apresentar-me. Jesuíta egípcio libanês de rito melquita, de 78 anos. Desde há três anos sou reitor do colégio dos jesuítas no Cairo, depois de ter desempenhado os seguintes cargos: superior dos jesuítas em Alexandria, superior regional dos jesuítas do Egito, professor de teologia no Cairo, diretor de Caritas-Egito e vice-presidente de Caritas Internationalis para Oriente Médio e África do Norte.
Conheço muito bem a hierarquia católica do Egito por ter participado durante muitos anos nas suas reuniões como Presidente dos superiores religiosos de institutos no Egito. Tenho relações muito próximas com cada um deles, alguns dos quais são meus antigos alunos. Por outro lado, conheço pessoalmente o Papa Chenouda III, a quem via com frequência. E quanto à hierarquia católica da Europa, tive a oportunidade de me encontrar pessoalmente muitas vezes com algum dos seus membros, como o cardeal Koening, o cardeal Schönborn, o cardeal Martini, o cardeal Daneels, o Arcebispo Kothgasser, os bispos diocesanos Kapellari e Küng, os outros bispos austríacos e outros bispos de outros países europeus. Estes encontros acontecem devido às minhas viagens anuais para dar conferências pela Europa: Áustria, Alemanha, Suíça, Hungria, França, Bélgica... Nestas viagens dirijo-me a auditórios muito diferentes e aos media (periódicos, rádios, televisões...). Faço o mesmo no Egito e no Oriente Próximo.
Visitei cerca de cinquenta países nos quatro continentes e publiquei uns 30 livros em 15 línguas, sobretudo em francês, árabe, húngaro e alemão. Dos 13 livros nesta língua, quiçá tenha "Gottessöhne, Gottestöchter" [Filhos, Filhas de Deus], que lhe fiz chegar pelo seu amigo o Pe. Erich Fink de Baviera.
Não digo isto para presumir, mas para lhe dizer simplesmente que as minhas intenções fundamentam-se num conhecimento real da Igreja universal e da sua situação atual, em 2009.
Volto ao motivo desta carta, e tentarei ser breve, claro e o mais objetivo possível. Em primeiro lugar, algumas constatações (a lista não é exaustiva):
1. A prática religiosa diminui constantemente. As igrejas são frequentadas por pessoas cada vez mais idosas que vão desaparecer num prazo bastante curto.
2. Os seminários e os noviciados esvaziam-se de dia para dia e as vocações desaparecem a um ritmo assustador. O futuro apresenta-se sombrio e não vemos quem virá atrás de nós para melhorar a situação.
3. Muitos padres deixam o exercício sacerdotal e o pequeno número dos que vão ficando, cuja idade frequentemente ultrapassa a da reforma, são obrigados a assumir o encargo de várias paróquias, fazendo-o de uma maneira apressada e administrativa.
4. A linguagem da Igreja é anacrônica, aborrecedora, repetitiva, moralizadora e completamente inadaptada à nossa época. Não pretendo afirmar que se deve dizer sim a tudo nem adotar uma atitude demagoga, pois a mensagem do Evangelho deve apresentar-se com toda a sua exigência e significado. O importante é começar a "nova evangelização" de que falava João Paulo II. E, ao contrário do que muitos pensam, ela não consiste na repetição de tudo o que é antigo e que não interessa a quase ninguém, mas na invenção duma nova maneira de proclamar a fé aos homens do nosso tempo.
5. Para consegui-lo, é urgente uma renovação profunda da teologia e da catequese que devem ser completamente repensadas e reformuladas. Infelizmente, temos de constatar que a nossa fé é demasiado cerebral, abstrata, dogmática e que fala bem pouco ao coração e ao corpo.
6. A consequência é que uma grande parte dos cristãos foi bater à porta das religiões asiáticas, das seitas, da "new age", do espiritismo, das igrejas evangélicas ou de outras parecidas. Ficamos admirados? Eles buscam noutro lugar o alimento que não encontram entre nós, pois têm a impressão que em vez de pão lhes oferecemos pedras.
7. No que diz respeito à moral e à ética, as imposições do magistério sobre o casamento, a contracepção, o aborto, a eutanásia, a homossexualidade, o casamento dos padres, os divorciados casados de novo, etc., já não interessam a quase ninguém e provocam nas pessoas cansaço e indiferença.
8. A Igreja católica que, durante séculos, foi a grande educadora na Europa, esquece que esta Europa se tornou adulta e intelectualmente madura, recusando ser tratada como uma criança que ainda não atingiu a idade do uso da razão. As maneiras paternalistas duma Igreja "Mater et Magistra" passaram de moda e são rejeitadas pela nossa época.
9. As nações que outrora foram as mais católicas - França, "primogênita da Igreja" ou o Canadá francês ultracatólico deram uma reviravolta de 180 graus, caindo no ateísmo, no anticlericalismo, no agnosticismo, na indiferença. No caso de outras nações europeias, o processo está em marcha. Pode-se constatar que quanto mais dominado e protegido pela Igreja esteve um povo no passado, mais forte é a reação contra ela.
10. O diálogo com as outras igrejas e religiões tem recuado. O progresso constatado durante meio século está atualmente muito comprometido.
Perante tais constatações, a reação da Igreja é dupla:
• Ou considera sem importância a gravidade da situação e se consola constatando certos fervores e conquistas no campo mais tradicionalista e nos países do terceiro mundo.
• Ou invoca a confiança no Senhor que a socorreu durante 20 séculos e que vai continuar a ajudá-la também a superar esta nova crise, como o fez nas crises precedentes. Afinal, não tem ela promessas de vida eterna?
A isso eu respondo:
• Para resolver os problemas de hoje e de amanhã, não basta refugiar-se no passado nem apoiar-se em amostras sem fundamento sério.
• A aparente vitalidade da igreja nos continentes em vias de desenvolvimento é falaciosa. Mais cedo ou mais tarde, essas novas Igrejas passarão pelas mesmas crises vividas pelo atual cristianismo europeu.
• A modernidade é incontornável e foi por a Igreja ter esquecido isto que passa hoje por tal crise.
• Por que razão continuar uma política como um jogo da cabra-cega? Até quando recusar ver as coisas como elas são? Porque é que havemos de tentar salvar as aparências, uma fachada que hoje não consegue convencer ninguém? Até quando continuar nesta teimosia, nesta intolerância total a recusar todas as críticas, em vez de ver nelas uma ocasião de se renovar? Até quando iremos adiar uma reforma que se impõe imperativamente e que já tardou demais?
• Repito o que disse no princípio: é pouco o tempo que nos resta. A história não fica à nossa espera, sobretudo numa altura em que o ritmo se acelera e tudo anda tão depressa.
• Qualquer empresa comercial, ao constatar prejuízos ou um mau funcionamento, põe-se imediatamente em questão, convoca peritos, tenta recuperar, mobiliza todas as suas energias para se transformar radicalmente.
• E a Igreja? Quando pensa ela mobilizar todas as suas forças vivas para uma transformação integral? Vai ela continuar a ser dominada pela preguiça, cobardia, medo, orgulho, falta de imaginação e criatividade, por um quietismo culpável, convencida de que Deus tudo vai resolver e de que a situação atual acabará por ser ultrapassada como já o foram outras situações, talvez piores, no passado?

O que é que se pode então fazer? A Igreja precisa de três reformas urgentes:
• Uma reforma da sua teologia e da sua catequese, repensando completamente a fé e reformulando-a de uma maneira coerente e compreensível para a sociedade contemporânea.
• Uma reforma da sua pastoral, abandonando as estruturas herdadas do passado.
• Uma reforma da sua espiritualidade, inventando outra mística e concebendo os sacramentos de outra maneira, para encarná-los na existência atual e adaptar à vida do homem de hoje. A Igreja é formalista demais. Temos a impressão de que a instituição abafa o seu carisma e de que, para ela, o importante é, ao fim de contas, a estabilidade exterior, superficial, aparente. Corremos mesmo o risco de que Jesus, um dia, nos trate "de sepulcros caiados".
Para terminar, gostaria que houvesse em toda a Igreja um sínodo geral com a participação de todos os cristãos, católicos e não católicos, para analisar franca e abertamente todos os aspectos de que lhe falei e outros que poderiam ser sugeridos. Esse sínodo (evitemos a palavra concílio) duraria 3 anos e seria concluído por uma assembleia geral que faria um resumo de todos os resultados e elaboraria as conclusões.
Termino, Santo Padre, pedindo-lhe para me perdoar tanta franqueza e audácia e solicitando a sua bênção paternal.
Pe. Henri Boulad, sj
henriboulad@yahoo.com
* Jesuíta egípcio libanês de rito melquita. Reitor do colégio dos jesuítas no Cairo