Não sou escritora, política, ou entendida em assuntos muito profundos como os que estamos debatendo e assistindo no momento. Mas em meio à enxurrada de textos que recebo todos os dias, me vejo na necessidade de reagir. Mais que um texto de posicionamento pessoal, eu quero apenas "vomitar" algumas idéias e sentimentos que estão me corroendo por dentro, e na impossibilidade de poder soltar um grito, me atrevo a escrever e espalhar alguns pensamentos, assim como muitos estão fazendo nestes dias.
Desde os primeiros debates e pesquisas do primeiro turno, até o resultado das eleições tenho tentado refletir sobre a responsabilidade dessas duas mulheres que se dispuseram a assumir o risco de concorrer à presidência da República. Desde há muito tempo queremos ver como mulheres e feministas a nós mesmas representadas no Planalto. E para nós mulheres, creio que foi fundamental ver essas duas mulheres, diferentes e iguais ao mesmo tempo, demonstrando sua capacidade de articular e mobilizar o Brasil em torno de dois temas tão importantes e urgentes para todo o país, bem como para toda humanidade. A partir desta campanha o rosto da mulher brasileira fará parte dos debates políticos. Não será mais possível ignorar a presença das mulheres na política, porque através delas todas nós estivemos representadas e fomos o alvo das atenções. No rosto de Marina a mulher pobre pode se ver, no rosto de Dilma a intelectual, a empresária, as mulheres que tiveram acesso à educação. Fomos vistas não como objeto de cama e mesa, mas como mulheres capazes de conduzir um país, e representá-lo no mundo.
Após o resultado do primeiro turno recai sobre essas mulheres uma enorme responsabilidade.
Dois temas polêmicos e urgentes e duas mulheres na condução do debate, ainda que o rosto de Marina esteja ausente da tela.
Conheço Marina como a maioria das pessoas. Sua história, sua vida de luta e sacrifício, sua coragem, que se mistura com o seu corpo franzino. Quando a vi em Porto Velho no intereclesial me impressionou a sua maneira de falar, mas me veio à mente, algo que às vezes experimento como mulher e pastora. Como é fácil arrancar aplausos no meio de quem pensa como a gente, ou está sedento de novidades. Como é fácil emocionar as pessoas com nossas estórias de vida.
Por sua força e determinação, e também pela estratégia de seus apoiadores, Marina foi capaz de trazer a discussão sobre o Meio Ambiente para o Ambiente Inteiro, em especial junto aos jovens, aumentando a onda verde. Mas toda onda é passageira, e o risco é que a discussão morra na praia, pois onda não se segura. É preciso mais Educação para que a juventude possa assumir essa luta com mais compromisso, e assim no futuro tenhamos um país mais "consciente e consistente" em relação ao Ambiente Inteiro.
Tão doloroso quanto ver a devastação do Ambiente Inteiro é assistir a discussão sobre o aborto, personalizado na candidatura de Dilma. Ninguém em sã consciência é favor do aborto. Assim como ninguém em sã consciência ateia fogo numa floresta em tempo de seca. Ambos são atos criminosos. A diferença é que os crimes contra a Natureza são difíceis de se comprovar. O aborto é fácil, pois a vitima é conhecida, está próxima de nós, e muitas vezes morta.
Quando uma mulher recorre ao aborto é porque lhe faltaram todas as informações necessárias para não engravidar: Educação sexual, métodos anticoncepcionais de prevenção, e homens com o mesmo conhecimento e respeito, capazes de impedir que uma gravidez indesejada aconteça. Porque uma gravidez só acontece quando se tem um homem na relação. E aí está o grande problema na questão do aborto. O homem está saindo ileso na discussão. E pior está conduzindo a discussão como quem está fora do problema. Olhando apenas para a vida que foi gerada por ele, e não para a vida que está ameaçada por causa dele. É importante perceber que quem está escrevendo e debatendo mais sobre o aborto são homens, em nome das Igrejas ou de seus próprios interesses. Digo das Igrejas porque por trás da Católica, outras se escondem ou incluem o seu discurso. A vida da mulher não interessa para os homens, não interessa para as Igrejas, até o momento em que está para acontecer um aborto. Nesse momento todos entram com seus discursos baseados na religião, na ética, na moral, fazendo prevalecer a lei e a justiça.
O tema do aborto entrou no debate para aterrorizar as pessoas e não para esclarecer e ajudar a pensar em políticas públicas para as mulheres. Somos mais de 50% das eleitoras e mãe dos outros 50%.
Compete a nós mulheres termos clareza sobre o cuidado com o nosso corpo, clareza sobre os interesses que se tem sobre o nosso corpo. Com o nosso corpo vendem-se de sabonete a carros importados. Somos responsáveis pela propaganda e pela compra de milhares de produtos. Somos responsáveis pelo cuidado da Criação Inteira.
Façamos valer a nossa condição de Mulher e o nosso direito a Opinar sem o autoritarismo de quem quer que seja, Estado - Igreja - Marido.
Neuza Tetzner é pastora da IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil