O absurdo e a Graça

Na vida hoje caminhamos entre uma fome que condena ao sofrimento uma enorme parcela da humanidade e uma tecnologia moderníssima que garante um padrão de conforto e bem estar nunca antes imaginado. Um bilhão de seres humanos estão abaixo da linha da pobreza, na mais absoluta miséria, passam FOME ! Com a tecnologia que foi inventada seria possível produzir alimentos e acabar com TODA a fome no mundo, não fossem os interesses de alguns grupos detentores da tecnologia e do poder. "Para mim, o absurdo e a graça não estão mais separados. Dizer que "tudo é absurdo" ou dizer que "tudo é graça " é igualmente mentir ou trapacear... "Hoje a graça e o absurdo caminham, em mim lado a lado, não mais estranhos, mas estranhamente amigos" A cada dia, nas situações que se nos apresentam podemos decidir entre perpetuar o absurdo, ou promover a Graça. (Jean Yves Leloup) * O Blog tem o mesmo nome do livro autobiográfico de Jean Yves Leloup, e é uma forma de homenagear a quem muito tem me ensinado em seus livros retiros, seminários e workshops *

11 de janeiro de 2011

Arturo Paoli, nosso irmão cósmico

Arturo Paoli, aos quase 100 anos, encontrou na intuição profética do frei Charles de Foucauld a tradução mais adequada do seu desejo de um testemunho radicalmente evangélico: "homem cósmico".

A opinião é do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, em artigo publicado no jornal La Stampa, 27-11-2010. A tradução é deMoisés Sbardelotto.

Eis o texto.
"Hoje à tarde, iremos reconstituir a visita aJesus!". Foi assim que o pequeno Arturo Paoli ouviu a mãe falar, enquanto saboreava um delicioso chocolate quente, oferecido pelo pároco às crianças que recém haviam recebido a primeira comunhão. Arturo passaria assim a tarde daquele dia de festa, em um hospital para idosos, onde a mãe prestava milhares de serviços, "visitando" Jesus no pobre, depois de ter recebido a sua visita na Eucaristia.

Nessa simples anotação de uma mãe, me parece que está encerrada a existência inteira – que chegou nestes dias aos 98 anos – de um homem de fé, de esperança e de caridade: Arturo Paoli nada mais fez do que restituir continuamente a visita de Jesus aos homens e às mulheres aos quais se fez próximo.

E, desse modo, tornou o próprio Jesus presente aos últimos, aos deserdados e aos marginalizados da história: parábola dessa acolhida recíproca foram o pensar, o falar e o agir desse "pequeno irmão" universal.

Silvia Pettiti em "Arturo Paoli. Ne valeva la pena" (Ed. San Paolo, 236 páginas) reconstrói com competência, participação e afeto a vida de um homem que atravessou todo o século XIX: trechos de conversas com o frei Arturo, confidências e documentos de amigos e conhecidos, material fotográfico e antológico permitem-nos conhecer a partir de dentro não só uma límpida testemunha do Evangelho, mas também os fatos da Igreja italiana e universal nos anos do fascismo e do pós-guerra, das esperanças conciliares e das expectativas latino-americanas, da redescoberta do pobre como destinatário privilegiado da boa notícia de uma salvação que inicia já aqui e agora.

"Justo entre as nações" por causa de sua obra de proteção e de salvação de diversos judeus depois das leis raciais, ativíssimo protagonista da Ação Católica em nível local e nacional, Arturo Paoli encontrou na intuição profética do frei Charles de Foucauld a tradução mais adequada do seu desejo de um testemunho radicalmente evangélico: "homem cósmico", ele havia sido definido por um professor universitário, e o cadinho do deserto do Saara irá moldar o temperamento desse homem de profunda catolicidade – isto é, capaz de pensar e ver a realidade na sua dimensão universal –, fará dele um cristão paciente e tenaz como só os mansos sabem ser, capaz ainda hoje de continuar a sua corrida, consumindo-se continuamente por aqueles pobres junto aos quais sabe que pode "restituir a visita a Jesus".

Interrogado sobre o seu passado, tão longo e fecundo, frei Arturo só pode afirmar com força: "Valeu a pena". Sim, como recitava Pessoa: "Tudo vale a pena se a alma não é pequena". E certamente não é pequena a alma desse pequeno irmão que, agora, tendo retornado à sua Lucca depois de ter passado fazendo o bem em toda a América Latina, sente-se como um barco leve, sem remos, que se deixa levar pela corrente para a foz tão esperada e desejada.

Para o leitor, ressoa o doce convite que encerra essas páginas: "Vejam o velho da margem. Tomem tempo. Vocês também podem dialogar com ele, porque a água corre muito lentamente... Não temam: o Amigo o leva pela mão, suavemente ou com energia, e não o deixará até o encontro com o Infinito".

Sim, Arturo Paoli foi e é uma autêntica testemunha do Evangelho nos nossos dias. Às vezes, não estava de acordo com as suas posições, mas sempre alimentei um grande respeito e reconhecimento por ele. Por isso, senti tristeza quando, no seu retorno à Itália, ele foi impedido de tomar a palavra em uma importante assembleia eclesial. O trabalho de Pettiti faz justiça também a essa ferida gratuita.
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=38784

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