Eu encontrei Jesus!Não, não pense que fiz algum retiro do tipo Cursilho da Cristandade, ou entrei para alguma igreja pentecostal. Não, eu o encontrei, simplesmente.
Eu estava indo para o consultório, andava distraído pela rua ainda um pouco
deserta, era cedo, e o vi. Ele estava deitado, num banco da praça, tinha a seu
lado um grande saco preto repleto de latinhas de alumínio. Tinha uma aparência sofrida,
o rosto marcado e aparência de quem há muito não toma um banho. Não me viu,
dormia profundamente. Segui...
Mais adiante tornei a encontrá-lo, estava também deitado, mas desta vez no chão. A despeito do calor estava coberto com um pano imundo. Tinha a seu lado uma cadeira de rodas muito velha em estado lastimável. Não pude ver seu rosto, estava voltado para a parede. Segui meu caminho e não muito distante na porta da padaria, ele novamente. Estava acordado e me estendeu a mão. Não era um cumprimento, era uma súplica. Tão humilde estava que cheguei a duvidar que pudesse se tratar do filho de Deus. Mas não havia dúvida era ele. Me pediu que pagasse um café e um pão, não tinha comido nada desde a véspera. Convidei-o a vir comigo à padaria. Ao entrarmos um segurança truculento pareceu não me notar, mas foi direto a Ele e segurando-O pelo braço disse em alto e bom som, “cai fora!“
Ele tentou argumentar e com voz mais forte o brucutu gritou:
”tá querendo levar uma porrada ?”
Interferi, disse que estava comigo e só então acho que o segurança me percebeu, mas foi logo atalhando, não “dotô, aqui ele não entra”. Perguntei O porquê e o homem se encrespou e logo alguns clientes vieram e seu auxilio contra mim argumentando que ele fedia, estava imundo... Ví que neste novo Brasil não adiantava argumentar, alguém já ensaiava as costumeiras frases: “ leva pra casa”, “só pode ser petralha”, “esses comunistas de merda...”
Não resisti. Fui até Ele e disse, não adianta Senhor, me espere ali fora que eu compro a sua média com pão e manteiga e levo ali fora.
Eu estava visivelmente envergonhado da forma como trataram o filho de Deus e certamente parecia bem transtornado. Ele não, talvez já esteja acostumado a esse tipo de ofensas, afinal para quem foi coroado de espinhos e pendurado numa cruz, isso deve ser coisa pequena. Levei até ele a média, o pão e pude perceber, pelo brilho de seus olhos diante daquela visão, que a fome era realmente muito maior do que eu imaginava. Me despedi e ele esboçou um obrigado, mas estava como que extasiado com aquelas que para ele deviam ser iguarias...
Segui, um pouco ainda aturdido com aquela cena e caminhei.
Bem na porta da igreja ele estava sentado, visivelmente drogado, murmurava algo
em sentido, um misto de lamento, súplica
e revolta.
A porta da igreja, ou melhor, meia porta estava entreaberta. Lembrei que depois que o sacerdócio passou a ser tratado como profissão, a segunda feira é dia do reposo remunerado dos sacerdotes, e a maioria das igrejas ou não abrem ou fecham cedo...
Já estava quase chegando ao meu prédio e pude ouvir uma gritaria, um corre- corre e gritos de pega! Pega! Passou por mim um Jesus adolescente, correndo, olhos esbugalhados. Ficou frente a frente comigo, nossos olhares, por fração de segundos se cruzaram. Pude notar neles o medo, o pavor. Só tive tempo de lhe dizer disfarçadamente: Corre! Vai! Ele foi...
Logo os que vinham atrás me perguntaram por que não o segurei. Respondi que não sabia que ele era o assaltante...
Subi para o meu consultório, ainda com a respiração meio ofegante e com o coração aos pulos.
Estas coisas têm me acontecido quase que cotidianamente. E eu tenho tentado entender. Sei que muitos me condenam, falam aquelas coisas de ensinar a pescar , mas eu argumento que na atual situação em que nos colocaram não há varas de pesca e nem redes disponíveis. Tenho certeza de que pescariam se houvesse oportunidade.
Lamento muito que isso aconteça em uma cidade em
que o prefeito é um bispo, de uma igreja que se diz cristã. É triste ver que cenas como estas aconteçam nas
portas das igrejas, sem que os ditos fiéis consigam reconhecer seu Deus e
senhor. A porta da igreja, ou melhor, meia porta estava entreaberta. Lembrei que depois que o sacerdócio passou a ser tratado como profissão, a segunda feira é dia do reposo remunerado dos sacerdotes, e a maioria das igrejas ou não abrem ou fecham cedo...
Já estava quase chegando ao meu prédio e pude ouvir uma gritaria, um corre- corre e gritos de pega! Pega! Passou por mim um Jesus adolescente, correndo, olhos esbugalhados. Ficou frente a frente comigo, nossos olhares, por fração de segundos se cruzaram. Pude notar neles o medo, o pavor. Só tive tempo de lhe dizer disfarçadamente: Corre! Vai! Ele foi...
Logo os que vinham atrás me perguntaram por que não o segurei. Respondi que não sabia que ele era o assaltante...
Subi para o meu consultório, ainda com a respiração meio ofegante e com o coração aos pulos.
Estas coisas têm me acontecido quase que cotidianamente. E eu tenho tentado entender. Sei que muitos me condenam, falam aquelas coisas de ensinar a pescar , mas eu argumento que na atual situação em que nos colocaram não há varas de pesca e nem redes disponíveis. Tenho certeza de que pescariam se houvesse oportunidade.
Ando preocupado por que as aparições de Jesus tem se multiplicado recentemente. Antes eu O via esporadicamente, hoje, há dias que O vejo mais de 20 vezes.
Certamente seria mais cômodo para mim adorá-lo nas espécies consagradas, ajoelhar-me diante da hóstia transubstanciada. Ou ainda diante de uma bela imagem do coração divino de Jesus ou até diante do crucifixo, incomodo e desafiador. Temo que a maioria de nós, tenha parado na sexta feira da paixão, e não tenha conseguido realizar em nós o mistério da ressurreição. Não conseguimos perceber o Jesus manso e humilde que caminha no meio de nós. Mas ele está no meio de nós, e apesar da maioria de nós repetir isso mecanicamente, não realizamos isso no dia a dia.
Ele está no meio de nós!
Ele é o mendigo, o ladrão, a prostituta, o pastor e o padre, a mãe e o pai de santo, o traficante, o miliciano, o policial, o prefeito o governador e o presidente da república, eu e você.
Por mais absurdo que isso seja, por mais que muitos estejam me considerando um herege, essa é a pura realidade que não queremos encarar. O mundo seria outro e bem melhor se acordássemos para essa realidade, se manifestássemos esse Deus que se encarnou na humanidade. Esse é o mistério da salvação. Essa é a redenção almejada. Que todos sejam UM, “como eu e o pai somos um”
Me veio a ideia de que Natal poderia ser todo dia, se deixassemos Jesus nascer através de nós. Se nos dispuséssemos a dar a luz, a ser como a silenciosa Maria, ouviríamos os anjos anunciando que Jesus, veio promover a Paz na terra, entre os que têm a boa vontade de promover o seu nascimento.
Me fez chorar...
ResponderExcluirComo tem sido constante, constrangedor e difícil encontrar Jesus todos os dias .
Ótimo texto e reflexão
Muito lindo, comovente e cruel o texto.
ResponderExcluirNos resgata da ilusão da vida boa e feliz, convivendo com a dor e sofrimentos de tantos ao nosso lado.
Conviver não é compartilhar.
Gostei muito.
Sensacional! Homilia de Prima. Teologia da Libertação na veia...Tanto o Papa Francisco como este que escreve assinam embaixo... Zezito de Oliveira
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